Um interessante memorial dos Pesquisadores/as e Docentes da Universidade de Brasília para entender o que está em pauta para julgamento no STF: ACO 362, 366 e 469 e ADI 3239-DF.
SÍNTESE DOS ARGUMENTOS ANTROPOLÓGICOS E JURÍDICO-CONSTITUCIONAIS:
1. Marco temporal: O debate sobre o argumento do marco temporal foi vencido na
Constituinte relativamente aos povos indígenas e não adotado no caso dos territórios
de quilombo. Impossibilidade de revisão pelos poderes constituídos. Limite material
que se impõe à interpretação constitucional. Afirmar o marco temporal é reduzir ou
eliminar o direito sobre as terras/territórios de vínculo étnico e cultural, conforme
consagrado no texto constitucional. Impossibilidade de atuação estatal em ofensa ao
principio do não retrocesso e ao caráter de progressividade dos direitos
fundamentais. Trata-se de limitação material implícita.
2. Historia: Indispensabilidade de revisitar e valorar os processos históricos de
expropriação das terras, de violências e de suposta ―proteção‖ aos povos indígenas.
Necessária consciência das consequências do projeto e do processo integracionista,
que provocou o deslocamento forçado e a expropriação das terras dos povos indígenas
e das comunidades tradicionais quilombolas.
3. Tradicionalidade e memorialidade: refere-se a um modo e não a circunstâncias
temporais de ocupação. Do ponto de vista dos próprios usos, costumes e tradições de
um povo indígena, a tradicionalidade é uma forma determinada de memória da terra,
considerando a relação constitutiva entre modos de habitar, de conhecer e de
transmitir conhecimento relativo ao território. As formas de utilização das terras
indígenas são inseparáveis da história de interações com entidades espirituais,
identificadas com ou controladoras dos recursos naturais de que se utilizam –
entidades e recursos quase sempre localizados em lugares específicos. A ocupação
tradicional funda-se nessa memória – na qual se entrelaçam valores morais,
conhecimento ecológico, regras sociais, crenças religiosas –, e é por sua vez reiterada
prática e narrativamente nas formas concretas e coletivas de habitação e uso.
4. Permanência (de habitação ou localização): as dinâmicas de mobilidade indígenas
enraízam-se não apenas em condicionantes ecológicas, mas também nos sistemas
religiosos, sociais e cosmológicos desses povos. Assim, os critérios constitucionais da
tradicionalidade – habitação em caráter permanente; utilização para atividades
produtivas: imprescindibilidade para a preservação dos recursos ambientais e
necessidade para a reprodução física e cultural, ―segundo seus usos, costumes e
tradições‖ – não constituem ―círculos concêntricos‖ num gradiente de permanência.
Eles são coextensivos, sobretudo se considerados no tempo. E é essa sobreposição
que forma aquilo que os índios identificam como seus territórios tradicionais.
5. Posse indígena: a noção de posse presente não é apenas insuficiente como também
excludente de outras formas de relação dos povos e comunidades com os seus
territórios. É incompatível com o que a Constituição consagra relativamente ao
conceito de pluralismo cultural elevado à posição de principio constitucional. O
argumento do esbulho renitente é incompatível com as implicações da posição
jurídica relativa de incapacidade civil atribuída aos indígenas antes da Constituição de
1988. A tese do esbulho renitente é histórica, ética e culturalmente inválida.
6. Autodeclaração: deve ser entendida como direito fundamental, e como critério
jurídico que vincula e limita o comportamento estatal (não pode ser afastada como
critério do agir estatal). Não cabe ao Estado interferir na consciência de
pertencimento cultural/étnico, e tampouco desconsiderá-lo como critério para
adotar medidas de salvaguarda dos direitos dos povos indígenas e das
comunidades tradicionais. A estatura de supralegalidade da Convenção 169 merece
ser acolhida.
7. Respeito ao Estado de Direito Constitucional: reforçamos a confiança de que os
agentes estatais, em todas as instâncias, estão submetidos à autoridade normativa da
constituição e à soberania da vontade constituinte originária, relativamente à decisão
política de afirmar a diversidade étnica e os direitos territoriais (originários) como
fundamento/valor ético da sociedade brasileira.
Para acessar ao documento completo: https://drive.google.com/file/d/0B84fywVZa9oCWTJyR19DYmpUSEU/view
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